Confissões maltrapilhas

Gabriela Pontes
2 min readJul 3, 2022

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Diante dos teus olhos,
deposito o meu coração.
Mas ele não é belo, nem puro:
ele é incerto.

O coração que vês agora
não é fiel ou amoroso,
não se alegra na verdade,
nem considera os outros superiores a mim.

Muito pelo contrário,
esse pedaço de pedra só pensa em si,
zela por si e deseja tudo para si.

Não tenho palavras amáveis,
não possuo um cântico agradável aos ouvidos.
Tudo que tenho são confissões maltrapilhas,
um coração duro
e orações desconfortáveis.

Trago a ti um coração fugitivo,
vacilante,
egoísta,
hipócrita.

É desagradável.
Não tenho beleza a te presentear,
mas eu não teria como vir de outra forma.
Seria inútil esconder qualquer uma dessas coisas
quando não há disfarce,
nem cobertura.

Diante da sua face brilhante,
coloco um coração opaco e apodrecido.
Olhe com cuidado:
ele exala arrogância e inveja.
Ele é tóxico e rebelde,
não gosta de ser corrigido.

Como a onda do mar,
ele vai e vem.
Não se decide em sua posição,
e corre para longe à menor perturbação.

Enfim,
aqui está.
Não há nada além de toda sorte de coisas reprováveis.
Não há ouro a ser escavado,
nem bondade a ser descoberta.

E também não venho desejosa de tua obra.
Como disse,
ele é incerto.
Mas venho,
torcendo para que isso baste.

Tudo que peço é que faças o necessário,
e que tenhas paciência e misericórdia.
Sei que tens mãos fortes e milagrosas.
Não duvido do que és capaz de realizar.

Ainda sim,
meu ânimo é dobre.
Reconheço e temo teu poder.
E se eu não mais me reconhecer?

Adiantei-te parte da situação,
mas sei que encontrarás mais do que sei:
soube que vês melhor do que nós mesmos.

Então,
só tenho um último pedido:
não desista dele.
Ele desejará partir,
mas não dê ouvidos.
Não que eu duvide do teu compromisso,
mas quero garantir que a obra seja completa.

É emergencial que tu intervenhas.
Não há ninguém a quem eu possa correr.
Então, tome meu coração e faça o que precisa,
pois, só em tuas mãos,
ele tem chance de viver.

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